Qualquer profissional de Educação Física sabe (ou pelo menos deveria), que a primeira fase de todo aprendizado motor é eminentemente cognitiva, ou seja, todo movimento novo que aprendemos, o fazemos primeiro em nosso cérebro. Somente depois de corretamente apreendido cognitivamente, o movimento novo passará a ser adequadamente experimentado pelo indivíduo, inicialmente com pouco ou nenhum acerto. Então gradualmente, com ajuda dos feedbacks intrínsecos e extrínsecos, e de exercícios adequados e corretamente organizados, o indivíduo vai aproximando-se do padrão correto de execução do movimento, com cada vez mais acertos e menos erros.
Para ser finalmente considerado aprendido, o novo movimento deve ser fixado, o que significa repetido corretamente sob diferentes condições e variáveis, de modo a ser dominado e executado com acerto na esmagadora maioria das tentativas.
Pois bem, se é assim, é lícito concluir que a clareza e objetividade das informações prestadas (não só, mas principalmente pela via verbal) desde o início deste processo são fundamentais para uma correta e eficaz aprendizagem motora. Estou convencido que já desde as primeiras explicações, passando pelas atividades de correção até os exercícios de fixação e domínio de qualquer habilidade, o profissional de Educação Física dever utilizar-se de um vocabulário técnico o mais correto e compreensível. É, aliás, por esta razão que precisamos sempre avaliar bem certas simplificações e adaptações que fazemos em nossa terminologia de aula: será que "estender" e "esticar" querem dizer a mesma para o nosso aluno? Usar "dobrar" ao invés de "flexionar" ajuda ou atrapalha a compreensão de nosso aluno?
No aprendizado da Natação não é diferente. Tenho percebido que desde muito cedo (oito ou nove anos de idade) o aluno é capaz de discernir muito bem as denominações que fazemos dos diferentes movimentos, partes do corpo, etc. Não devemos subestimar a capacidade de compreensão de nossos alunos e atletas. Denominações simplistas inadequadas só atrapalham a compreensão daquilo que solicitamos e, consequentemente, daquilo que é preciso ser feito. E entre alguns tantos casos, gostaria de falar sobre a golfinhada no nado Borboleta.
Para mim, golfinhada é uma ação motora que envolve o corpo todo (pernas, tronco, braços), numa ondulação com forte movimentação de quadril. Este movimento, dentro do ciclo do nado Borboleta é executado exclusivamente no ataque (entrada) das mãos e braços no prolongamento do corpo. Durante a golfinhada, o nadador eleva vigorosamente o quadril, enquanto as pernas e pés movimentam-se para baixo, torso e cabeça submergem para a expiração e o agarre das mãos no início da puxada submersa.
Como denominar então aquela pequena ação de pernas (flexão e extensão dos joelhos) executada no empurre final dos braços, com as mãos junto às coxas e braços ao longo do corpo? Que nome dar para aquele movimento de membros inferiores sem participação dos quadris, no exato instante em que o borboletista respira e, portanto, precisa estar com o torso e cabeça elevados? Golfinhada certamente não, pois golfinhada é o nome de outro movimento bem diferente. Bem, se o movimento é quase que exclusivamente de pernas, nada mais adequado que chamá-lo de pernada.
Considero, portanto, que a descrição mais correta para a coordenação básica do nado borboleta é "uma golfinhada e uma pernada para cada ciclo completo de braços" e não "duas golfinhadas para cada ciclo de braços". Não devemos nos referir a uma pernada como golfinhada ou vice-versa, pois muito além de ser uma óbvia incorreção técnica, isso só confundirá os nossos alunos, retardando a assimilação dos movimentos corretos ou, o que é pior, ocasionando a assimilação real de duas golfinhadas (ambas com ação de quadris) para cada ciclo de braços, defeito dificílimo de ser corrigido e que prejudica sobremaneira a respiração do nado e consequentemente a sua continuidade e eficácia.
Em livros da nossa área essa incorreção é infelizmente muito comum. Algumas poucas publicações fazem uma diferenciação parcial, chamando a pernada de golfinhada fraca e a golfinhada propriamente de golfinhada forte. Eu diria que é melhor do que simplesmente igualar os nomes, mas é conceitualmente insuficientemente, pois (insisto) uma pernada não é uma golfinhada, fraca ou forte.
Resumindo, acredito que da mesma forma como outros profissionais da área de saúde, o uso correto da nomenclatura técnica deve ser uma preocupação de todo profissional de Educação Física e, em particular, dos professores de Natação. Não por vaidade ou diferenciação profissional, mas simplesmente por pragmatismo pedagógico.
Paulo Henrique Bonacella - Fonte
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